sábado, 22 de agosto de 2009

Algumas premissas para se discutir sobre política

Amigo internauta,

Brasileiro adora conversar. Quando no centro da conversa há uma garrafa de cerveja, é certo que se discutirá política. Aliás, é um hábito muito saudável, tanto conversar sobre política quanto beber moderadamente. Porém, nas conversas que ando tendo, acho que há uma falta de conceitos básicos sobre política. Aqui vão apenas alguns que chamam mais a minha atenção.

1- Democracia não se resume ao desejo da maioria

A ditadura da maioria não é democracia, é populismo. É coisa de Hugo Chavez. É impôr à força o desejo da maior parte da população sob o restante, independente da opinião da minoria.

Talvez ter vindo de uma ditadura, situação em que uma minoria impõe à força seus desejos sob a maioria, tenha causado esse mal-entendido na cabeça de alguns. Mas uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Democracia significa um pacto de convivência entre toda a sociedade. Significa que a maioria não pode esmagar a minoria. Significa que minoria tem poder, representatividade, voz, e tem o direito legítimo de lutar pelos seus anseios e interesses.

2- A esquerda não são só mocinhos e a direita não se resume a bandidos

Lá vem os males da ditadura de novo. Realmente é complicado, no Brasil, ser a favor da direita quando a direita era apenas o braço político da ditadura. Continua complicado quando a direita ainda é representada por quem foi o braço político da ditadura. Espero que quando essa geração que mamou nas tetas da ditadura morra ou caia fora do poder seja enterrada junto essa ideia que vêm dando sustentação a políticos que se utilizam de um discurso e uma imagem de esquerda para apresentarem uma forma de governar idêntica à direita.

3- O voto

É por meio da política que instituições maiores que o indivíduo impõem mudanças à vida deste. Política, portanto, se resume mais a que ações são tomadas que quem foi o autor destas. Portanto, a participação não pode se resumir a apenas escolher quem serão os protagonistas dos próximos quatro anos, mas em acompanhar e procurar interferir nas ações que eles irão tomar.

A pessoa que não vota mas procura se comunicar com políticos e transmitir seus anseios tem uma participação política mais intensa que a que sempre comparece na eleição e no restante do tempo está preocupado apenas com o que acontece na novela ou com o jogo do próximo domingo.

Votar não é participar da política. É só escolher os principais personagens que participam desta.

4 - O que mata o Brasil são os analfabetos, nordestinos, pobres, etc.

É terrível que no Brasil haja analfabetos, miseráveis, incultos, e realmente isso é um problema grave. Mas é hipócrita e idiota achar que a culpa dos males da nação está justamente na camada mais explorada do país. É dizer que a vítima é a responsável pelo crime que sofreu, não o bandido.

Hipoteticamente falando, é verossímil imaginar que o voto dos que estão em situação de risco tão grande que consideram usar o voto como mercadoria para suprir suas necessidades básicas é a fonte da escolha de maus políticos. Mas a prática mostra que a coisa não é bem assim. Quando o estado de São Paulo elege como deputado mais votado um notório desperdiçador de dinheiro público (estou gentil hoje) como o Maluf, o que leva pro congresso não só o próprio, mas vários coleguinhas de igual estirpe via quociente eleitoral, não dá pra dizer que só o nordeste é irresponsável.

Especialmente no estado em que voto, no DF, tenho acompanhado quanto políticos associados à corrupção ganham em zonas eleitorais de alto poder aquisitivo. Ao contrário do que a classe média pensa, o preferido dos miseráveis também parece ser o queridinho dos ricassos. Ah, mas criticar milionário pega mal, o bom é falar mal de quem passa fome.

5 - É injusto que um deputado num estado se eleja com poucos votos e no outro com milhares

Essa vai especialmente para os paulistas. Eles adoram falar isso numa tentativa desesperada de obter ainda mais poder político pra si, pouco se importando que eles estão tirando o pouco poder político de pessoas que são muito mais dependentes do estado.

Porém, o deputado que se elegeu com menor número de votos na história recente veio exatamente do estado de São Paulo. Em 2002, quando Enéias foi o deputado mais votado desse estado, o quociente eleitoral trouxe com ele mais alguns coleguinhas de partido. Um desses não teve 300 votos. Com 300 votos não é possível se eleger deputado estadual em qualquer unidade da federação. Mas no estado de São Paulo, foi possível para se eleger deputado federal. O voto de menos de 300 paulistas foi mais importante que o voto de milhares de eleitores de outros estados.

Há outras ideias que acho que precisam ser mais claras para as pessoas que gostam de falar de política, mas essas são apenas as que me chamam mais a atenção, amigo internauta. Espero que elas contribuam para discussões mais sadias. E, acima de tudo, que as pessoas não fiquem apenas no discurso. Se o povo brasileiro se mobilizasse para a política com a metade do ardor com que se manifesta sobre a seleção brasileira, teríamos um país em que os governantes seriam tão bons na gestão pública quanto nossos craques dominam a bola.

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