domingo, 4 de janeiro de 2009

Música-obra e música-uso

Amigo internauta,

Na mensagem anterior sobre música, falamos um pouco sobre a forma numa composição musical, e sua importância para determinar uma composição expressiva. Vamos entender um pouco mais essas palavras.

Como a música é uma forma de comunicação humana que constitui uma linguagem, é bem útil fazer analogias com a linguagem verbal para entender melhor alguns de seus conceitos. Compare essas duas frases:

"Operários de todo o mundo, uni-vos"
"Companheiros, vamos, tipo assim, firmar uns com os outros"

A mensagem que as duas pretendem transmitir é a mesma, porém a expressividade delas não é igual.

No entanto, é provável que, em função da situação em que é se dá a comunicação, a frase mais expressiva seja a mais inadequada. Além disso, não podemos esquecer que não é só a expressividade de uma frase que nos marca, mas o conteúdo da mensagem em si. Temas que não te agradam continuarão sendo desagradáveis para você, amigo internauta, mesmo que sejam ditos da melhor e mais adequada forma possível. Na música as coisas funcionam de maneira similar.

Por isso não podemos perder de vista que não podemos olhar uma composição musical apenas pelo ponto-de-vista da obra, mas também do usuário.

Olhar a música apenas pelo ponto-de-vista da obra é crer que há composições que são patrimônio cultural e artístico da humanidade, e que devem ser preservadas como tal, assim como o Coliseu e a Mona Lisa.

Apesar de acreditar que a humanidade ficaria mais pobre se as sinfonias de Beethoven ou as canções de Tom Jobim caíssem no esquecimento, tenho dúvidas se é assim que o mundo da música funciona. Um caso em especial me intriga.



Benjamin Franklin (1706-1790) inventou um instrumento musical chamado de glasofone. O som que ele produz é de uma beleza peculiar, e recorda um órgão. O próprio Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) escreveu composições originais para esse instrumento. O vídeo acima é um exemplo.

Estamos diante de um instrumento criado por um dos mais célebres homens da história, a quem devemos o uso da eletricidade e que assinou a declaração de independência dos Estados Unidos da América; que tem no repertório boas músicas escritas por um dos mais famosos compositores de todos os tempos; e produz um som belo. É um bom exemplo de instrumento a ser preservado como patrimônio da humanidade mas, apesar de um pico de popularidade no século XVIII, hoje está quase extinto.

Quando olhamos pelo ponto-de-vista do usuário, partimos da idéia que as pessoas envolvidas fazem uso da música para o que lhes interessa. Seja um músico que busca dominar mais seu instrumento, seja um ouvinte que quer criar um bom fundo musical para uma situação, a função que a música exerce tem importância similar à sua própria essência.

Dessa forma, uma canção de altíssima qualidade musical, mas inadequada para uma ocasião, dá vez à outra que, mesmo pessimamente escrita, consegue atender bem àquela necessidade do usuário.

Portanto, é preciso reconhecer que há uma distintação entre a essência de uma composição (sua qualidade) e o uso que se faz dela (sua função). Imaginar que há uma relação direta entre esses elementos pode levar a mal-entendidos, entre eles o mais comum é pensar que uma composição muito adequada para um uso seja necessariamente de alta qualidade, apenas porque ela atende bem a uma situação específica.

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